A conjuração que teve lugar na Capitania de Minas Gerais por volta do ano 1789, mais conhecida como “Inconfidência Mineira”, talvez seja a mais conhecida revolta do período colonial brasileiro, ainda que não tenha sido levada a cabo. O único dos conjurados sentenciado à pena capital, o Alferes Joaquim José da Silva Xavier, cognominado “Tiradentes”, é o único brasileiro homenageado com um feriado nacional, seu nome abre o livro de Aço dos Heróis do Pátria Brasileira, como também da nome ao Palácio do Governo de Minas Gerais, da Assembleia do Rio de Janeiro, à guarda de honra da Polícia Militar de Minas Gerais, além de ser o patrono de todas as polícias militares do Brasil. A despeito de toda esta projeção, é também um dos eventos da história do Brasil em torno do qual há mais desinformação, desconhecimento e até mesmo teorias da conspiração. Há quem diga que o movimento não passava de conversas de poetas ou que seria um movimento elitista, eco da revolução francesa, conduzido por sociedades secretas e até que o próprio Tiradentes não teria morrido na forca naquele dia 21 de abril de 1792. O próprio nome pelo qual é conhecido o movimento, Inconfidência “Mineira”, evoca a ideia equivocada de que seu objetivo era a independência apenas da Capitania de Minas Gerais, como se fizesse sentido a independência de uma capitania sem saída para o mar, cercada por todos os lados de seu então colonizador. O que estas afirmações escondem na verdade é que a conjuração de 1789 foi na verdade, nada mais nada menos que o início de um processo que culminaria com a independência do Brasil 33 anos depois.
É fato que ao final do século 18 a noção de identidade nacional do Brasil não existia e nem mesmo o que se conhecia como o Brasil correspondia ao que ele se tornou após a independência. Quando se falava em estado do Brasil não incluía o que é hoje as regiões norte e parte do nordeste brasileiro, por exemplo. Em 1798 se daria a Conjuração Baiana, em 1817 a Revolução Pernambucana, mesmo após a independência ainda surgiriam vários outros movimentos independentistas. Porém, a chamada Inconfidência Mineira foi o primeiro movimento cujos líderes falavam explicitamente em independência do Brasil. Tanto é assim que a 21 de abril de 1865, em comemoração aos 73 anos da morte de Tiradentes, o poeta Machado de Assis escreveu: "Ora , o crime de Tiradentes foi simplesmente o crime de Pedro I e de José Bonifácio . Ele apenas queria apressar o relógio do tempo , queria que o século XVIII , data de tantas liberdades , não caísse nos abismos do nada, sem deixar de pé a Liberdade Brasileira. Entre os vencidos de 1792 e os vencedores de 1822 não há senão a diferença de resultados." Em 1862, era escolhido Largo do Rocio, local onde Tiradentes foi enforcado, para a instalação da estátua equestra de Dom Pedro I que tornara o Brasil independente. Presente na cerimônia de inauguração, foi o próprio Imperador Dom Pedro II quem disse que “o Alferes que ali morrera, dera o primeiro passo para Independência concluída por seu pai Dom Pedro I”.
É fato que entre a idealização da Independência pelos conjurados de 1789 e sua conquista em 1822 se passaram 33 anos. Tiradentes foi morto e outros24 conjurados sentenciados ao degredo, a maioria morrendo no exílio e muitos dos que lutaram pela independência em 1822sequer haviam nascido quando se deu a inconfidência mineira. Alguns porém sobreviveram ao exílio e retornaram ao Brasil e apoiaram a independência em1822.O Capitão José Rezende Costa, após cumprir sua sentença, retornou a Minas Gerais e foi nomeado procurador da Comarca de São João Del Rei, sendo depois chamado pelo próprio Dom João VI para exercer a função de contador Geral do Erário, na capital Rio de Janeiro. Após a independência, o primeiro imperador do Brasil, Dom Pedro I, o manteve no cargo até 1827 por sua lealdade. O padre Manuel Rodrigues Costa, após cumprir sua sentença, também retornou ao Brasil em1804 e continuou defendendo publicamente os ideais da Independência, apoiando o príncipe D. Pedro em sua campanha. Após a independência, Padre Rodrigues Costa, foi nomeado Cônego da Capela Imperial por Dom Pedro I. Ambos foram eleitos deputados por Minas Gerais e participaram da Assembleia constituinte de 1823. Padre Rolim, o mais rico dos inconfidentes e um de seus principais líderes também continuou defendendo a independência ao retornar ao Brasil e teve seus bens restituídos pelo Imperador após a independência. O Capitão Antônio Dias Coelho, cunhado do Inconfidente Alvarenga Peixoto, reformado desde 1816, pediu para reverter à ativa para apoiar o príncipe na campanha pela independência, sendo nomeado pelo mesmo para comandar as tropas da Província de Minas Gerais.
É certamente desconhecido da maioria dos brasileiros que egressos da Inconfidência Mineira participaram da campanha pela independência apoiando o príncipe Dom Pedro de Alcântara. Mais desconhecido ainda deve ser o fato de que Dom Pedro estudou o movimento, pelo qual tinha grande interesse. Quando o príncipe foi à capital mineira para pacificar um movimento que se levantava contra a independência, em sua viagem, era acompanhado dois profundos conhecedores da Conjuração de 1789: O agora Tenente-general Antônio Dias Coelho, revertido à ativa e comandante das tropas mineiras e seu conselheiro e confessou, Padre Belchior Pinheiro, filho, sobrinho e neto de militares dragões de Diamantina. Ao passar por Vila Real de Queluz, hoje Conselheiro Lafaiete, Dom Pedro, quis conhecer os locais onde os Inconfidentes se reuniram e registrou entusiasmado em seu diário que sentou-se à mesa em torno da qual reuniam-se os conjurados de 1789. Além deste registro, a coincidência dos eventos que se seguiram sugere, inclusive com bastante força, que D. Pedro I conhecia os planos dos conjurados e orientou-se por eles. Os inconfidentes pretendiam primeiro levantar a maior força militar da colônia, os “Dragões Reais de Minas”, com a participação do próprio comandante da força, Tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade. Começado o levante em Minas Gerais, o próprio Tiradentes levantaria o Rio de Janeiro e o Padre Toledo asseguraria o apoio de São Paulo. Padre Rolim já teria garantido a adesão da Bahia e o apoio com o fornecimento de materiais bélicos. O Sargento-Mor Luiz Vaz de Toledo comandaria o contingente de resposta, caso o Rio de Janeiro não aderisse ao levante. Assegurada a independência de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia, o plano dos conjurados era que as outras províncias fossem aderindo à independência uma uma a partir daí. Foi exatamente isto que aconteceu em 1822. O presidente da província de Minas Gerais José Fonseca Vasconcelos, enviou 6 companhias de dragões ao Rio de Janeiro para apoiar o príncipe Dom Pedro que iniciou a campanha pela independência a partir do Rio de Janeiro. Após pacificada a bernarda de Francisco Inácio, São Paulo aderiu e apoiou a independência e a província da Bahia foi a que mais fortemente se levantou contra Portugal. A seguir, as outras províncias foram sendo incorporadas, como Pernambuco, Ceará, as províncias do Maranhão e Grão-Pará ao longo de 1823 e a Cisplatina no início de 1824 consolidando a independência de toda a América portuguesa como um novo país, o Brasil.
Não obstante a participação e apoio dos conjurados de 1789 e a própria semelhança dos planos traçados por estes e o que se deu a partir de 1822, o próprio “grito do Ipiranga” teve a participação decisiva de um mineiro, profundo conhecedor da Inconfidência Mineira. Quando o Príncipe Regente retornava de São Paulo após pacificar a Bernardo de Francisco Inácio, foi surpreendido às margens do Riacho Ipiranga por um mensageiro que trazia notícias de que Portugal enviaria mais 14 batalhões ao Brasil, com ordens de prender a todos que apoiaram o príncipe Dom Pedro e de levar o agora ex-regente de volta à Europa. Diante da notícia, Dom Pedro aconselhou-se com um especial integrante da sua comitiva, o padre Belchior Pinheiro que lhe respondeu: "Se Vossa Alteza não se faz rei do Brasil, será prisioneiro das cortes portuguesas. Não há outro caminho se não é Independência. "Foi graças a este conselho que Dom Pedro proferiu o retumbante brado que mudou para sempre a nossa história.: “Se Vossa Alteza não se faz rei do Brasil, será prisioneiro das cortes portuguesas. Não há outro caminho se não é Independência. ”Foi graças a este conselho que Dom Pedro proferiu o retumbante brado que mudou para sempre a nossa história. Foi graças a este conselho que Dom Pedro proferiu o retumbante brado que mudou para sempre a nossa história. Foi graças a este conselho que Dom Pedro proferiu o retumbante brado que mudou para sempre a nossa história:“ Se Vossa Alteza não se faz rei do Brasil, será prisioneiro das cortes portuguesas. Não há outro caminho se não é Independência. ”Foi graças a este conselho que Dom Pedro proferiu o retumbante brado que mudou para sempre a nossa história.
Há que se considerar também que até mesmo os regimes de governo que supostamente seria adotado pelos conjurados de 1789 e que efetivamente foi adotado pelo Brasil após a independência podem ser mais próximos do que nos levam a crer. Não apenas Tiradentes como os próprios inconfidentes são tidos como ícones do ideal republicano no Brasil. Porém, a história é bem diferente. É fato que Tiradentes era um entusiasta do ideal republicano, mas não se pode negar que o conceito de “república” àquela época era muito diferente daquele que assumiu nos dias atuais. Estava muito mais relacionado com democracia e probidade com a coisa pública do que com o presidencialismo. Em 1789 os Estados Unidos da América precursor do modelo de república presidencialista a atual mal tinha passado dos 10anos de independência e apenas dois anos em 1787, antes mesmo que a nação americana tivesse uma constituição, o pai fundador Alexander Hamilton propunha uma monarquia eletiva como forma de governo para o país recém-independente. De fato, segundo os planos dos inconfidentes, o desembargador Tomás Antônio Gonzaga, deveria assumir o governo após a independência, mas em caráter provisório, por um ano e nesse período é que se decidiria a forma de governo, com a maioria, dos conjurados defendendo abertamente a monarquia, única forma de governo na qual seria viável a divisão de poderes, conforme afirmava o Barão de Montesquieu, um dos principais influenciadores dos conjurados. O próprio Desembargador Tomás Antônio Gonzaga, em sua última visita ao governador da capitania, Visconde de Barbacena, na tentativa de cooptá-lo para o movimento o teria dito: “Esta capitania é a que mais facilmente se pode levantar sem dependência das demais, seja por sua situação de defesa, seja pela sua produção de riquezas e
literatura.”“Falta apenas uma cabeça, um rei e uma rainha”. Se Barbacena teria aderido à conjuração não se sabe. Mas independente do sistema e forma de governo, certamente este deveria ser um governo democrático, constitucional, representativo e federativo, ideias que egressos do movimento levariam para a constituição do império na Assembleia de1823.
Com tudo isso podemos concluir que, ao contrário do que muitas vezes nos faz parecer, a conjuração de 1789, conhecida como “Inconfidência Mineira”, não foi oposta ao império que o Brasil se tornou após a independência. Muito pelo contrário, foi o início de um processo que seria concluído em 1822, com a participação de remanescentes da conjura, a partir dos planos desta e como apoio inicial da mesma força militar ,os Dragões Reais de Minas. Mais ainda, a conjura de 1789 cultivou e difundiu os mais nobres valores, essenciais à construção não somente de um Brasil independente, fosse a 1789 ou em 1822, como a qualquer nação, inclusive tão necessários nos dias em que vivemos: civismo, erudição, a fé na Santíssima Trindade, censo de Justiça, lealdade aos seus pares e um amor incondicional a liberdade pela qual altivamente se dispõe a luta e à morte.
Texto do Prior Nelmar Nepomuceno
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